Brasil de Fato | Circo unifica movimento em defesa da democracia, em Curitiba

Ação vai durar 10 dias e pretende aliar cultura e participação política na luta contra o golpe no Brasil.

Por Ednubia Ghisi, para o Brasil de Fato
Circo da democracia

“A lona do circo vai possibilitar a sinergia entre o debate político e a cultura, que estará presente ao longo de toda a programação”, explica Ana Carolina Caldas, jornalista que integra a equipe de produção do evento. / Guilherme Jaccon

De 5 a 15 de agosto, picadeiro, palhaços e acrobacias farão parte da paisagem da Praça Santos Andrade, no Centro de Curitiba. Ponto tradicional de manifestações políticas da capital paranaense, a Praça dará lugar ao Circo da Democracia, idealizado pela articulação Advogados pela Democracia. Passa de 100 o número de entidades que aderem à proposta, entre elas as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, movimentos culturais, sindicais, estudantis e do campo.

A expectativa dos organizadores é promover um amplo fórum popular de debates sobre os rumos da democracia brasileira. Pela grande adesão de diversos setores, o circo também unifica a resistência ao golpe e às tentativas de retiradas de direitos sociais e trabalhistas, protagonizadas pelo governo interino de Michel Temer e pelo Congresso Nacional. As datas coincidem com o período em que o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff deve ser votado no Senado.

“É um momento de abrir e aprofundar a reflexão, porque todos nós temos certeza que se abre no Brasil um novo processo de discussão longo, profundo e denso”, afirma Carlos Frederico Marés de Souza Filho, professor de Direito na PUC/PR e membro da articulação Advogados pela Democracia. “Nada é mais simbólico do que um circo para representar a cultura popular, que se expressa como arte, consciência e transformação”, explica, sobre o formato escolhido pelos movimentos para contrapor o cenário de violação à democracia e de avanço do conservadorismo.

Marés

Cultura e participação

Ao longo dos 10 dias, a lona colorida do circo paranaense Zanchettini e sua arquibancada de mais de mil acentos darão espaço às conexões entre política e cultura. Estão previstos shows de artistas locais e nacionais, mesas de debate, rodas de conversa, exibições de filmes, exposições, peças de teatro, oficinas, entre outras atividades.

A programação promete ser intensa, mas o professor Carlos Marés dá ênfase para a primeira atração: “Cada um de vocês deve pegar nas mãos dos seus filhos e trazer para vez a lona levantar. É talvez um dos espetáculos mais bonitos da Terra, quando o circo, do nada, se transforma em um espaço cultural simbólico, cheio de luzes e estrelas”, disse durante o lançamento da proposta, ocorrido na segunda-feira (11), no Salão Nobre do Prédio Histórico da UFPR, com direito a apresentações circenses de equilibrismo e malabarismo.

Para além do entretenimento, a classe artística também será protagonista da atividade. É o que explica Ana Carolina Caldas, jornalista que integra a equipe de produção: “A lona do circo vai possibilitar a sinergia entre o debate político e a cultura, que estará presente ao longo de toda a programação”, garante

Está confirma a presença de artistas nacionais e de ‘pratas da casa’, entre eles Carlos Careqa, Thaís Gulin, Banda Eddie, Oswaldo Rios e Orquestra Latino Americana – OLA, Thayana Barbosa, Garibaldis e Sacis, Maracatu Aroeira, Projeto Brasil, Samba do Sindicatis, além da trupe do circo Zanchettini. Todos se apresentarão gratuitamente, sem cobrança de cachê.

Para as mesas de debate, estão confirmadas lideranças políticas e intectuais de outros estados: Raquel Rolnik, arquiteta e urbanista e professora da USP; Marcelo Lavenére, ex-presidente do Conselho Federal da OAB; Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – MTST; João Pedro Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST; e Ciro Gomes, vice-presidente nacional do PDT.

Jonas Oliveira, do Levante Popular da Juventude e da Frente Brasil Popular, vê na proposta do circo uma possibilidade ampliar o diálogo com a população: “A gente precisa reformular os modos de fazer política, criar novas ferramentas que potencializem e revigorem a discussão e a participação popular na democracia, que agora está profundamente abalada com este governo interino e golpista”.

Malabares

Inspiração no processo Constituinte

Usar o circo como ambiente e linguagem para grandes debates de interesse público não é inédito no Paraná. A primeira experiência ocorreu em 1987, com o Circo da Constituinte, instalado também na Santos Andrade, além de outros quatro bairros de Curitiba. O processo ocorreu com apoio da prefeitura, na gestão de Roberto Requião (PMDB), a partir da iniciativa da Fundação Cultural, à época presidida por Carlos Frederico Marés de Souza Filho.

Nas memórias do professor, os sete meses de duração da primeira edição do circo intensificaram a participação popular na Constituinte, que, somada ao movimento nacional aflorado na época, resultou em uma Carta Magna “razoavelmente democrática”. Para Marés, a Constituição de 1988 sofreu um golpe e está fragilizada: “É por isso que nós imaginamos que estava na hora de montar novamente o circo, não da ‘Constituinte Já’, mas da democracia. Para voltarmos a discutir por que e o que deu errado, no sentido de que a Constituição não foi posta em prática como devia ter sido, e foi novamente rasgada pelos poderosos”, aponta.

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