Publicação é resultado de oficinas e encontros de integrantes das padarias com educadoras/es do Cefuria
Por: André Fedel, Ednubia Ghisi e Franciele Petry Schramm
Fotos: Isabel Hinça e Ednubia Ghisi
A poucas quadras da movimenta Linha Verde, a comunidade São Cristóvão, no Xaxim, acolheu o encontro que marcou o lançamento do livro ‘Multiplicando as Sementes’, que apresenta a Rede Paranaense de Padarias Comunitárias Fermento na Massa. Do início da manhã até o final da tarde chuvosa de sábado (18), mais de 200 pessoas passaram pelo espaço, entre integrantes das padarias, de grupos de economia solidária, de entidades de apoio, estudantes, moradores da região e militantes de movimentos sociais.
Na abertura do encontro, integrantes das 30 padarias comunitária da Rede entraram na roda para dar as boas vindas aos presentes. Além da feira com produtos das padarias, a mesa do café da manhã foi recheada de variadas produções dos grupos. Artesanatos e alimentos agroecológicos também foram expostos por coletivos da Feira Permanente de Economia Solidária e do Assentamento Contestado, da Lapa.
A integrante da padaria Nova Vida, do Campo do Santana, Odete Schran, resume o principal objetivo da publicação: “Nós pensamos um livro de fácil acesso para os nossos consumidores”. Produzido nos encontros dos Territórios e do Conselho Gestor das padarias, o material é fruto do trabalho coletivo: “Uma pessoa só construindo, a gente teria a ideia só de um. Com as pessoas se envolvendo, você tem a Ideia de como elas vêem o mundo e como pensam a construção de algo”, argumenta.
Ana Inês Souza, coordenadora geral do Cefuria, ressalta a importância que a entidade dá ao processo de sistematização das experiências de organização popular, para que possam servir de material de multiplicação. No caso da publicação ‘Multiplicando as Sementes’, a socióloga frisa o processo coletivo de produção como parte do processo de organização da Rede. “O livro coroa uma experiência que vem sendo construído há anos, pois isso é um orgulho para o Cefuria”.
Ao longo do dias, integrantes das padarias e educadores do Cefuria conduziram a animação e a apresentação do livro. As três rodas de conversa realizadas ao longo do dia foram momentos de formação e troca de experiência entre as pessoas participantes. Os diálogos foram sobre a relação da economia solidária com a questão de gênero, os movimentos sociais e a juventude.
Movimentos Sociais
Paulo Cesar Brizola, integrantes do Assentamento Contestado/MST, da Lapa/PR, contribuiu com a roda de debate sobre movimentos sociais e economia solidária, com apoio de Antonio Bez, educador do Cefuria.
Para abrir o debate, os participantes foram provocados a dizer como percebem a economia solidária. “Economia que nasce do povo”, “Solidariedade que não é monetária”, “Economia que parte da própria realidade”, “Apoio mútuo para melhorar nossas vidas”, foram algumas das respostas do grupo. Já a economia capitalista promove a desigualdade e o lucro para grandes grupos econômicos. “A nossa sociedade vive uma contradição, onde a produção da riqueza do país não fica com quem a produz. Essa contradição precisa ser apontada”, garantiu Antonio Bez.
Paulo Brizola trouxe sua experiência de agricultor e militante do MST. Ele explicou que a origem do Movimento está no questionamento da propriedade privada como um dos motores no modelo capitalista. “Romper as cercas é fundamental, mas nossa história de organização nos fala que precisamos ir além e perceber quais são as demandas de nosso povo”, explicou. Como exemplos, Brizola falou da preocupação do MST com a garantia do direito à educação, à saúde, além do desenvolvimento da juventude, cultura e da produção das famílias agricultoras.
Segundo o agricultor, as associações e cooperativas do campo possibilitaram a produção e distribuição em maior escala, via Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e também por iniciativas de grupos de famílias e agricultores que constituíram alternativas de distribuição direta aos consumidores das cidades. “Hoje há muita produção dos pequenos agricultores e, ao mesmo tempo, há um grande contingente de consumidores nas cidades. Nossa grande dificuldade, que precisamos superar juntos, é a distribuição e a construção crítica destes processos com a sociedade”, afirmou.
Percebendo a grande produção e variedade de produtos das padarias, houve um debate das possibilidades de ingredientes e produtos dos pequenos agricultores e da reforma agrária terem algum espaço no processo de produção das padarias comunitárias.
Juvesol
Trabalhar para viver, ou viver para trabalhar? Com essa pergunta, integrantes da articulação Juvesol Paraná começaram a roda de conversa sobre a juventude e economia solidária. Criada em São Paulo, a Juvesol está presente em vários estados reúnem jovens que buscam viver outra economia.
O grupo trouxe o dado de que apenas 13% dos jovens estão na universidade, e que a precarização do trabalho afeta diretamente a juventude. “A gente encontra os jovens trabalhando em supermercados e McDonalds. Eles não sabem que tem essa alternativa. O jovem às vezes não quer entrar no mercado formal de trabalho. Ele quer ir além”, aponta Diego de Castro, um dos integrantes da Juvesol.
“O jovem tem que ter sonho, mas o mundo capitalista vem e corta nosso sonho, porque ele quer que a gente siga um padrão que não existe”, diz Isabel Hinça, que também compõe a articulação. Na opinião da estudante, até o campo de estágio universitário serve como fonte de “mão de obra barata”. “Isso é precarização do trabalho dentro da universidade”, garante.
Marilene Zazula é professa da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e faz parte da Tecsol – Incubadora de Economia Solidária Marilene. Ele relata que há quem resista à proposta da economia solidária dentro do ambiente acadêmico. “A gente sabe que a maioria desses estudantes é criado desde pequeninho para o mercado de trabalho capitalista. A gente é mal visto na universidade porque temos uma proposta diferente dessa lógica”.
Lucas de Melo Ribeiro tem 21 anos e faz parte da padaria Q. Delícia, localizada na Vila 23 de Agosto, bairro Ganchinho, região Sul de Curitiba. A partir de experiências de trabalho anteriores, ele aponta que uma das principais diferenças entre a economia solidária e a capitalista é a forma de gestão: “Na padaria não tem aquela pressão, a gente decide tudo em conjunto. Bem melhor do que trabalhar na economia capitalista, que na primeira crise manda a gente embora”.