Evento realizado entre os dias 3 e 4 de maio, em Curitiba, reuniu cerca de 130 pessoas. A necessidade de articulação de iniciativas de economia solidária em equipamentos sociais públicos foi apontada com uma das alternativas para o fortalecimento da relação entre economia solidária e população em situação de rua.
Por Franciele Petry Schramm
Estimuladas, as pessoas participantes do Seminário ‘População em Situação de Rua e Economia Solidária: construindo uma nova sociedade’ não economizaram nos sonhos – igualdade, justiça social, moradia digna para todas e todos são alguns dos desejos apresentados no evento, realizado entre os dias 3 e 4 , em Curitiba, na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
Apesar dos diferentes sonhos, está apontada a mesma solução: a união e o trabalho coletivo são fundamentais para fortalecer os processos de conquistas. União e coletividade que são também encontradas na Economia Solidária, como apontou o evento promovido pelo Cefuria em conjunto com a Tecsol – Incubadora de Economia Solidária da UTFPR e com o Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR).
O seminário integrou as atividades construídas dentro do projeto Coopera Rua – projeto desenvolvido através de parceria firmada entre Cefuria e o Ministério do Trabalho e Previdência por meio da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) –, que pretende estimular e fortalecer a prática da economia solidária com a população em situação de rua de Curitiba.
Cerca de 130 pessoas participaram do evento, que contou com um público bastante variado – estudantes, profissionais de instituições públicas e da sociedade civil, integrantes de empreendimentos econômicos solidários e da população em situação de rua.
Alternativa à lógica excludente de produção e consumo capitalista, a Economia Solidária carrega consigo os princípios da autogestão, cooperação e solidariedade. Nela há espaço para todos e todas.
Coordenador do MNPR, Leonildo Monteiro apontou a importância de estar relacionando economia solidária com a população em situação de rua, historicamente excluída do mercado de trabalho. “A gente quer ser visto como cidadão, sujeito de direitos. E a Economia Solidária abre nossos sonhos, ao gerar renda e resgatar a autoestima”.
“A economia solidária não é assistencialismo – é transformação”, destacou a integrante do Conselho do Cefuria, Lourdes Marchi, durante as atividades. Ela explicou que, mais do que gerar renda, essa forma de produzir e consumir valoriza o trabalhador e a trabalhadora.
A troca de experiências e a construção de possibilidades marcou os debates. “A gente que está de fora vê que mais do que esperança – vê que é possível. É possível produzir economia solidária em Porto Alegre, Belo Horizonte, e em Curitiba também”, apontou um dos participantes.
Com 35 anos de atividades, o Cefuria é referência história em educação popular e economia solidária em Curitiba, como apontou a coordenadora do Centro de Formação, Ana Inês Souza. “Ao mesmo tempo que fazemos a crítica a esse modelo explorador, capitalista, apontamos alternativas em uma economia horizontal e democrática”.
Uma relação possível
A partir das experiências compartilhadas, os participantes apontaram possibilidades de fortalecimento da Economia Solidária com a população em situação de rua na capital paranaense. Moradora da Casa das Mulheres e LBT, Damaris aponta a possibilidade de pensar atividades com a população em situação de rua nos equipamentos públicos. “Em alguns lugares da FAS [Fundação de Ação Social] o pessoal só tem a opção de ver TV e a gente fica um olhando para a cara do outro”. O mesmo apontamento foi realizado por outros participantes que acessam esses espaços.
A experiência de diferentes coletivos mostra que a Economia Solidária já é uma realidade em Curitiba. Como a Rede Paranaense de Padarias Comunitárias Fermento na Massa, que reúne 30 padarias comunitárias de Curitiba e cidades próximas. Integrante da Rede, Nair de Queiroz da Cunha contou a história do grupo, e apresentou o funcionamento do coletivo. Em geral, as padarias comunitárias da rede produzem seus pães duas vezes por semana – os outros dias são destinandos à formação e aperfeiçoamento das integrantes – com uma produção mensal de 25 a 30 mil unidades.
As mulheres representam 95% das 120 pessoas que integram as padarias. Algumas das integrantes possuem idade mais avançada, e em alguns casos não possuem marido ou filhos, como em um exemplo de uma colega, trazido por Nair. “A padaria é a vida dela. Ela não sabe ler, e trabalha mais devagar, por conta da idade, mas a gente vai ajudando ela”.
Conselheira do Cefuria, Lourdes Marchi acompanha grupos como a Feira Permanente de Economia Popular Solidária e a Rede Pinhão de Clubes de Troca, ambos em Curitiba e região metropolitana. Lourdes aponta como o processo de Economia Solidária tem contribuído com as pessoas que integram os grupos, muito para além da geração de renda, mas na valorização do sujeito e resgate da autoestima. E se emociona ao lembrar da história de mulheres que começar a praticar a Economia Solidária ao produzirem artesanato. “Elas diziam achar que não seriam capazes de fazer isso. Isso é vida resgatada!”.
Troca de Experiências
As experiências das pessoas que praticam a Economia Solidária em Curitiba são, em diversos aspectos, próximas à população em situação de rua. Como é o exemplo da dificuldade de inserção no mercado de trabalho, sofrida por mulheres com filhos, pessoas com mais idade e por aqueles que estão na situação de rua.
Experiências de outros estados brasileiros indicam que é possível. Com propósito semelhante ao Coopera Rua, o projeto Empreendendo Vidas, executado pelo Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável (Insea), de Belo Horizonte, acompanha a formação de cinco empreendimentos econômicos solidários. Integrando um dos coletivos, ligado à gastronomia, Ludwig Karklin, trouxe a experiência da Economia Solidária a partir de quem tem a vivência de estar em situação de rua. “O projeto me abraçou. Há muita individualidade nas ruas – até como uma forma de sobrevivência – mas passei a acreditar no outro e na construção de um coletivo”.
Salgados, bolos e conservas são produzidos e comercializados pelo grupo, que divide de forma igual a renda produzida – que não é muita, mas é importante. “Esse pouco [dinheiro] encheu nossos olhos, porque nos faz sentir população producente”, conta Ludwig.
Projeto semelhante é executado pelo Camp – Centro de Assessoria Multiprofissional, em Porto Alegre e região metropolitana. No estado, as atividades são desenvolvidas de forma aproximada com a Escola Municipal de Ensino Fundamental Porto Alegre (EPA). A EPA tem como proposta pedagógica a educação popular junto com pessoas em situação de risco social, como a população em situação de rua.
Estudante da EPA e participante do projeto Ecosol Pop Rua, Paulo Roberto da Silva conta que está aprendendo a ler e escrever, e desenvolve outras habilidades, como o trabalho com cerâmica. “Aprendo devagar e com jeito”, revela. Em sua proposta, a EPA procura respeitar o tempo-espaço do outro, diferente do que costuma ser praticados nas escolas do país, onde as aulas são dividas em tempos determinados.
Animada com os relatos, a Assistente social e integrante da coordenação do Cefuria, Vanda de Assis, destaca a importância da troca de experiências com outros estados. “Que rico é isso para a população em situação de rua de Curitiba, que já apontou neste evento a demanda por atividades”, avalia.
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Fiquei muito feliz em ver este Seminário ter se realizado com participação e trocas de experiências maravilhosas de 3 estados brasileiros. Somente o não comparecimento oficial da administração municipal me fizeram ficar envergonhado em relação aos nossos visitantes. Senti também uma falta de respeito da prefeitura em relação aos trabalhos desenvolvidos pelo MNPR que se organiza aqui em Curitiba. Creio que serão encaminhados as proposições e sugestões para que possam se redimir de suas ausências.
O povo da Economia Solidária foi extremamente importante em todas as discussões e proposições.
No mais o Povo da Rua de Curitiba e a Ecosol estão de parabéns por mais esta conquista na luta por seus direitos. Paz e luz na caminhada de todas/os
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