Relato da segunda etapa do Curso de Formação de Agentes de Desenvolvimento Local. A atividade trouxe para discussão a temática “Educação Popular”.
Por Franciele Petry Schramm e Andréa Barros
“Só o conhecimento liberta, embora muita gente reduza o saber à escolarização, à erudição acadêmica, ao arquivo de informações ou à mera assimilação e repetição de conceitos. O conhecimento é mais que informação, palestra, curso ou leitura de um livro – quem diz que sabe, mas não sabe fazer, ainda não sabe”.
Trecho do livro Trabalho de Base,de Ranulfo Peloso
“Bandido bom é bandido morto”. “Em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher“. “Pau que nasce torto, morre torto”. Esses são alguns mitos comuns em nosso cotidiano, entendidos como verdades imutáveis. Mas é real que bandido bom é bandido morto? Que pau que nasce torto morre torto?
A segunda etapa do Curso de Formação de Agentes de Desenvolvimento Local e Economia Solidária do projeto Coopera Rua trouxe como proposta a problematização e desconstrução de mitos, através do debate da educação popular.
Trazendo a ruptura de conceitos e ideias já estabelecidas na sociedade, esse modelo de educação se apresenta como importante instrumento de libertação para a classe trabalhadora, visto que possibilita outra leitura da realidade. Mas o que é, e em que se diferencia essa concepção de educação? Os participantes ajudaram a construir essa resposta, através do debate, fomentado por figuras e troca de saberes.
Educação Popular x educação tradicional
Escrever, desenhar, cantar,reciclar, inventar, compor, cuidar da terra e jogar futebol são algumas das coisas que as pessoas que participaram da segunda etapa do curso sabem fazer – e muito bem, diga-se de passagem. Questionados sobre como e onde adquiriram o conhecimento e a prática, os participantes indicaram que de maneira autodidata em suas trajetórias de vida através de solidariedade, troca e compartilhamento de saberes por parte de familiares, amigos e colegas de trabalho.
Não à toa, nenhum/a das/os participantes indicou que aprendeu na escola aquilo que sabe fazer de melhor, ainda que não se possa negar que a escola tenha desempenhado importante papel nesse processo.
Imagine o seguinte cenário: uma sala de aula cheia, com mesas enfileiradas, um professor ou professora à frente da turma explicando alguma matéria, enquanto os alunos e alunas observam calados. Esse cenário é familiar?
A educação tradicional é marcada pelo condicionamento de conteúdos, que pode levar a respostas programadas e conteúdos abstratos. Para Paulo Freire, importante educador popular brasileiro, esse modelo é caracterizado por uma concepção bancária da educação, onde o educando seria um “banco” onde o educador deposita o conteúdo que ele considera adequado. Andréa Barros, educadora popular do Cefuria que ajudou na facilitação da atividade, destacou algumas contradições desse modelo. “A escola, na forma como é construída, serve de instrumento para o sistema capitalista e para a reprodução social opressora”.
Leia a cartilha Uma Pedagogia Humanizadora: a pedagogia de Paulo Freire
Já a Educação Popular é marcada por uma concepção de formação libertadora, que tem como ponto de partida o pensar do povo. Nesse modelo, o conhecimento é voltado para a transformação da realidade, através da elevação do nível de consciência da classe trabalhadora, com vistas à organização popular. Por isso, a educação popular tem como proposta a problematização, e não a entrega de solução pronta aos problemas apresentados. O pensar é coletivo, diferente do pensar para alguém ou para algum grupo. Afinal, educadores/as e educandos/as possuem saberes, mesmo que de diferentes formas.
Um dos participantes, apontando umas das figuras, indicou: “A educação formal é injusta, porque prevê conteúdos iguais para pessoas que são diferentes”. Outra participante lembrou: “Cada um tem uma experiência de vida, que muitas vezes não é levada em consideração”.
Para Paulo Freire a educação popular é a pedagogia do oprimido e uma pedagogia da libertação. A primeira, possibilita que o oprimido vá desvelando o mundo da opressão, comprometendo-se com a sua transformação; a segunda, passa a ser a pedagogia de um processo permanente de libertação, a partir de quando que é superada a pedagogia do oprimido. “A educação formal desenvolve em nós a nossa inteligência e a Educação popular, a sabedoria”, aponta Andréa.
Nesse processo, o educador motiva o diálogo e problematiza a realidade. A educadora popular explica que, a partir disso, saberes diferentes ajudam a construir saberes coletivos. “Educação popular é o que estamos fazendo aqui hoje, com a manifestação de todos, que compartilham opiniões diferentes”, indica.
Essa foi a segunda etapa de um total de dez previstas para o Curso de Formação de Agentes de Desenvolvimento Local e Economia Solidária. A atividade é realizada dentro do projeto Coopera Rua, desenvolvido através de parceria firmada entre o Cefuria e o Ministério do Trabalho, através da Secretaria Nacional de Economia Solidária, pelo convênio nº 811901/2014.
Participam desses encontros pessoas em situação de rua, representantes de instituições que prestam serviços a essa população, apoiadores, integrantes de coletivos de economia solidária e do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR).
>> Confira os materiais de apoio utilizados na segunda etapa:
– Cartilha Uma Pedagogia Humanizadora: a pedagogia de Paulo Freire
– Vídeo A Revolução dos Angicos com Paulo Freire
>> Sugestão de leitura:
-Educação Popular e Trabalho Popular – Capítulo do Livro ‘O Trabalho de Base’, organizado por Ranulfo Peloso e Mauro Iasi
>> Leia o relato da 1ª Etapa do Curso de Formação de Agentes de Desenvolvimento Local:
Trajetórias de Vida: reconhecendo diferenças e entrelaçando semelhanças
Veja mais fotos da segunda etapa: