Trajetórias de Vida: reconhecendo diferenças e entrelaçando semelhanças

Relato de educação popular da 1ª etapa do Curso de Agente de Desenvolvimento Local, desenvolvido dentro do Projeto Coopera Rua. O primeiro encontro provocou as participantes e os participantes a falarem de suas trajetórias de vida, de luta e de resistência, reconhecendo diferenças e entrelaçando semelhanças.

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Por Franciele Petry Schramm

Integrado ao desenvolvimento do projeto Coopera Rua, o Cefuria (Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo) deu início ao Curso de Formação para Agentes de Desenvolvimento Local, no último dia 2 de outubro. A atividade reuniu pessoas em situação de rua, representantes de instituições que prestam serviços a essa população, apoiadores, integrantes de coletivos de economia solidária, representantes de órgãos públicos e do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR).

ADL_1 Etapa  (24)O curso, que será realizado em dez etapas, traz como proposta a formação de agentes que já contribuem ou venham a contribuir com a população em situação de rua. As atividades permitirão que pessoas de diferentes lugares tenham contato e troquem experiências a partir de uma perspectiva de construção coletiva e de economia solidária.

Essa primeira etapa trouxe como proposta a reflexão das semelhanças e diferenças das pessoas presentes. Para ilustrar isso, as participantes e os participantes foram convidadas e convidados a contar sua trajetória de vida. Em frente a um mapa do Brasil e utilizando fios de lã, as pessoas marcaram os pontos onde escreveram suas histórias. O resultado disso tudo foi um emaranhado de fios muito interessante, que mostrou as divergências e convergências entre a trajetória dos presentes. Os pedaços de fio conseguiram dar materialidade a um processo de migração, que teve suas causas e conseqüências contadas pelos participantes. “Identificar os processos de migração e suas causas ajudarão a perceber que somos todos diferentes, mas que temos interfaces”, explicou o coordenador do Coopera Rua, Luis Pequeno.

ADL_1 Etapa  (17)Os elementos trazidos nessa primeira etapa serão necessários para a continuidade dos debates. Cada trajetória de vida reflete valores, vivências, percepções, saberes e resistência, elementos que intermediarão as discussões que serão levantadas no curso. “Isso vai ajudar a ressignificar o sentido do porque a gente trabalha, estuda e luta por políticas públicas”, explica Pequeno. “Percebemos que os atores trazem consigo experiências diversas, de locais diversos, que podem ser enriquecidas se forem somadas em um coletivo”.

Ao final do curso de formação, o acúmulo de experiências ajudará a fortalecer o desenvolvimento local. A atividade é realizada através de parceria firmada entre o Cefuria e o Ministério do Trabalho, através da Secretaria Nacional de Economia Solidária, pelo convênio nº 811901/2014.

Trajetórias diversas

Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Roraima, Ceará e Goiás foram alguns dos estados onde as histórias das participantes e dos participantes começam. Diferentes percalços e vitórias marcaram a vida de cada um, aproximados pela atividade proposta pelo Coopera Rua. Semelhante a todas e todos participantes, a vontade de trocas mútuas de aprendizado com as diversas experiências.

ADL_1 Etapa  (62)Os motivos que levaram as pessoas a mudarem seus trajetos de vida foram traduzidos em palavras-chave e colocados dentro de uma grande bolsa. Casamento, estudos, violência doméstica, emprego, falecimento foram algumas das razões que obrigaram que as pessoas saíssem de um lugar para outro.

“Não sou morador de rua. Eu estou em situação de rua”, iniciou um dos participantes, que ressaltou a importância de ter em mente que estar em situação de rua é levar em consideração que tal condição pode ser superada. Afinal, estar na rua na maioria das vezes não é uma opção como a de morar em uma casa.

Histórias de dificuldades e, principalmente, de superação, marcaram os relatos. Exemplo disso foi a de Júlio*, que a partir de conflitos familiares e a morte de parentes, acabou sendo acolhido pelas ruas da cidade. Transitou entre diversos municípios, trabalhando em diferentes lugares e empregos. “Eu não sabia que eu corria de mim mesmo”. Passou pela experiência do uso do álcool. “Às vezes eu ficava na praça e pensava: ‘eu vou morrer aqui, se continuar assim’”. Com o auxílio de uma rede de apoio, pode acessar uma casa de acolhimento que realiza o serviço de ressocialização de pessoas que se encontram em situação de rua. “Sabe o que é você olhar para uma pessoa e falar: ‘hoje é meu último dia na rua? ’”, conta Júlio, que está há um mês acolhido no local.

ADL_1 Etapa  (48)As histórias de diferentes “Júlios” chamaram a atenção das/os participantes. Foram diversos os motivos que levaram diferentes pessoas a estar em situação de rua. Conflitos familiares foram uma das principais razões que desencadeou essa circunstância. “A família não apareceu na hora da dificuldade”, conta  um dos participantes que está em situação de rua. “Por isso não basta pensarmos em como vamos tirar as pessoas dessa situação. Temos que trabalhar a prevenção”.

O participante se diz contente em conhecer propostas como a do curso. “Quando eu vejo as organizações se unindo, eu me animo”, conta. E aponta: “O ser humano tem que ser o centro de nossa formação”.

Outra participante revelou não conhecer o MNPR, e avaliou que oportunidade de trocar experiências com o movimento e com diferentes pessoas durante as etapas do curso para agentes de desenvolvimento local será importante. “O que eu conheço aqui hoje eu vou levar para a vida”, conta.

*nome fictício

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