Segundo advogada do Centro de Referência Dom Helder Câmara, crença que diminuição da maioridade penal ajudaria no combate à violência é resultado da sensação de insegurança produzida pela grande mídia.
O papel dos meios de comunicação – e principalmente da Rede Globo – no debate da redução da maioridade penal foi discutido em aula pública realizada na Vila São Pedro, no Bairro Xaxim, nesta segunda-feira (27). Mais de 50 pessoas acompanharam a atividade organizada pelo Cefuria em parceria com a Frente Paranaense pelo Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão (Frentex/PR). O evento integra a Semana de Descomemoração do Aniversário da Globo, organizada pela Frentex.
A advogada no Centro de Referência em Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, Mariana Malheiros, ajudou a puxar a discussão e explicou a razão do debate. “A sensação de insegurança que faz com que acreditemos que a redução da maioridade penal resolveria o problema da segurança pública está sendo produzida pela grande mídia”, avalia.
Mariana apresentou os cinco principais motivos para discordar da Proposta de Emenda à Constituição (PEC_ 171/93), que reduz a idade mínima penal de 18 anos para 16 anos no Brasil. Entre eles, está o fato de que o país já possui um sistema punitivo para adolescentes em conflito com a lei. Apesar de críticas pontuais ao modelo, o sistema socioeducativo brasileiro consegue fazer com que 70% dos jovens atendidos que voltam ao convício social não reincidam no crime – no sistema penal convencional, esse número é de cerca de 30%.
Além disso, a advogada apontou a tendência mundial de idade penal mínima de 18 anos. O consenso para tal idade é resultado de estudos realizados por psicólogos e sociólogos, que consideram que a personalidade de uma pessoa é formada até esse período.
Para Mariana, a discussão do projeto está muito baseada no efeito, e não da causa que levam que jovens tenham conflito com a lei. Segundo ela, isso seria também uma forma de criminalizar a pobreza. Estudos indicam que o sistema carcerário do Brasil é um dos com maior número de detentos – cerca de 500 mil presos – onde a grande maioria possui situação de vulnerabilidade econômica e com baixo grau de escolaridade. “O Brasil não é um país da impunidade. É da punidade seletiva”, aponta.
A advogada também avalia que uma possível aprovação da diminuição da maioridade penal no Brasil seria uma forma de isentar o Estado de se responsabilizar pela proteção e garantia dos direitos dos jovens do país. Segundo dados dão Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), mais de 36% dos jovens brasileiros morrem por homicídios – o número retrata nada mais que a falta ou ineficiência de políticas públicas destinadas essa parcela da população.
Concentração de mídia e a diminuição da maioridade penal
A integrante da Frentex, Ana Paula Salamon, explicou durante o evento que a sensação de insegurança e impunidade gerada pelos meios de comunicação é resultado também da concentração midiática. O fato de um único grupo econômico deter diferentes meios de comunicação faz com que o discurso que violenta o direito dos jovens seja reforçado ainda mais.
A jornalista defendeu que a democratização dos meios de comunicação pode contribuir na propagação de outras falas que desconstruiriam o discurso classista que hoje é pregado pela maior parte. A Rede Globo, que completou 50 anos no último dia 26 de abril, detém 70% dos veículos de comunicação (como emissoras de televisão, rádio e revistas) do país, e alcança quase 100% do Brasil. Com isso, é uma das maiores fontes de informação de grande parte dos brasileiros.
“Enquanto isso não muda, temos que buscar ferramentas alternativas de comunicação para que seja possível levantar nossa voz”, aponta a integrante da Frentex. A transmissão da aula pública pela Rádio Gralha, rádio livre alimentada por um coletivo de comunicadores populares, demonstra a possibilidade da democratização direta dos meios de comunicação.
Na luta contra o monopólio e o oligopólio dos meios, está sendo construído um Projeto de Lei de Iniciativa Popular (PLIP) da Mídia Democrática. Pensado a partir da experiência regulatórias de outros países e inspirado nos tratados internacionais ratificados pelo Brasil, o PLIP foi criado de forma a regulamentar artigos da Constituição Federal que versam sobre a Comunicação Social.
Para que seja apresentado ao Congresso Nacional, o conhecido como Projeto de Lei da Mídia Democrática precisa da assinatura de 1% do eleitorado brasileiro (cerca de 1,4 milhão de pessoas).
Para intensificar a coleta de nomes, a campanha Para Expressar a Liberdade dispõe a assinatura para o PLIP também em meio eletrônico.